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sexta-feira, junho 24, 2005

 
ANTÔNIO GOIS

O Rio é uma grande Daslu

RIO DE JANEIRO - A elite carioca deve estar com o orgulho ferido por ver sua irmã paulistana ganhar tanta atenção por causa da inauguração de uma Daslu vizinha à favela Coliseu.
Justiça seja feita: essa idéia de escancarar o luxo e de colocá-lo vizinho à miséria é genuinamente do Rio. Foi aqui que se criou Ipanema ao lado do morro do Pavão-Pavãozinho ou o Leblon colado ao Vidigal.
São Paulo tem a Daslu, mas aqui há o Fashion Mall. Ele pode não ter a extravagância de um heliponto, como há na loja paulistana, mas, em compensação, nossa Rocinha (sua vizinha) é bem maior do que a Coliseu.
Talvez por mera questão geográfica, o fato é que o projeto de exclusão da elite carioca quase sempre tolerou -com algumas exceções- a proximidade física com os pobres, desde que esses não se atrevessem a freqüentar as mesmas lojas, os mesmos bares ou a mesma faixa de areia.
Chegou-se a criar um mito de que, por causa dessa proximidade, essa seria uma cidade mais democrática. Aqui, classe média ouve samba e funk e acha muito bacana, desde que, obviamente, suas meninas não se envolvam com os garotos do morro.
São Paulo foi mais explícita. Mandou derrubar "saudosas malocas" para construir "edifícios altos". Foi, assim, colocando os pobres em seu devido lugar: bem longe da riqueza.
Talvez seja por isso que a Daslu ao lado de uma favela chame tanto a atenção dos paulistanos. É como se fosse uma falha no sistema operacional de exclusão da cidade.
Em comum às duas elites, no entanto, está a eficiência com que executaram seus projetos de exclusão. Como mostraram os historiadores Manolo Florentino e João Fragoso no livro "O Arcaísmo como Projeto", é falsa a idéia de que o Brasil fracassou como nação por causa da explosão de desigualdade.
Muito pelo contrário. Nosso projeto foi um sucesso. Faltou deixar claro apenas que o objetivo era mesmo este: criar uma pequena Daslu no meio de uma imensa Rocinha.